quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Razões para a Regionalização de Portugal Continental (I)

"A Regionalização consiste em fazer com que decisões públicas que dizem especificamente respeito a territórios mais restritos que o país no seu todo, mas mais vastos do que os municípios deixem de ser tomadas pela Administração Central ou organismos dela dependentes e passem a ser tomadas por órgãos eleitos pela população dessa região". [Mendes, Américo M. S. C. (1997). "Os Prós e os Contras da Regionalização". Comunicação apresentada no Encontro Nacional da ANIMAR. Tomar].


Mapa das regiões administrativas aprovado pela lei nº 56/91 de 1991
Aproveitando os que espero serem os meus últimos meses neste "país há beira mar plantado", vou aqui apresentar algumas conclusões de um trabalho que fiz no primeiro ano de Mestrado, precisamente com o título "Razões para a Regionalização de Portugal Continental".

Perspectiva histórica da regionalização de Portugal Continental:

Pode-se afirmar que o processo de regionalização em Portugal teve o seu efectivo arranque com a Constituição da República Portuguesa (CRP) elaborada após a revolução do 25 de Abril de 1974. Desde 1976 que a regionalização administrativa está consagrada na CRP, e reflecte os ideais de desenvolvimento democrático preconizados pelo 25 de Abril. De facto, um dos pilares deste movimento foi precisamente a aspiração a uma democracia plena, que se pode tornar mais próxima com a regionalização.
Infelizmente a partir daí não se tem feito mais nada de significativo.

O projecto de estabelecimento de regiões administrativas de 1976, tem os seus antecedentes enquadrados no III Plano de fomento de 1969, em que foram institucionalizadas cinco "Regiões-Plano", cuja fundamentação assentava na lógica de planeamento de médio-prazo com vista ao desenvolvimento regional como forma de desenvolver o país. No entanto, os planos de médio-prazo nunca foram postos em prática e, este processo foi sendo posto de parte.

Daqui se pode já retirar a conclusão de que a regionalização de Portugal Continental é um projecto com contornos bem definidos e sustentado pela lei portuguesa, e o facto de nenhuma revisão constitucional o ter retirado da lei fundamental do país, quer apenas dizer que este é um assunto de grande importância para o desenvolvimento mais harmonioso e equilibrado do país.
No entanto, apesar das propostas apresentadas à Assembleia da República por vários Governos (quase sempre perto do período de campanha eleitoral), em nenhum deles se verificou continuidade.

Em 1991 foi aprovada a lei nº 56/91, lei-quadro das regiões administrativas, mas nunca foi regulamentado, a não ser pela lei de criação das regiões administrativas em 1998 (lei nº19/98 de 28 de Abril) que propunha a criação de 8 regiões (ver capa):

 Entre Douro e Minho;

 Trás-os-Montes e Alto Douro;

 Beira Litoral;

 Beira Interior;

 Estremadura e Ribatejo;

 Lisboa e Setúbal;

 Alentejo;

 Algarve;

No entanto, antes de se definirem as possíveis regiões, devem ser estabelecidas quais as funções, competências e áreas de actuação dos governos regionais, para depois se definirem limites territoriais compatíveis para o exercício destes aspectos.

Um dos principais pilares do regime democrático saído da Revolução de 25 de Abril de 1974, foi a implementação de um Estado descentralizado, que seria concretizado entre outros aspectos, através da regionalização pois, mesmo atribuindo mais poderes e competências aos municípios,
o processo de descentralização administrativa e consequente desenvolvimento da democracia não seriam alcançados na sua totalidade, sobretudo devido à heterogeneidade de poderes atribuídos aos municípios (que limitam as suas competências em algumas áreas da administração pública).

Assim, o processo de descentralização administrativa só será totalmente consumado com a criação de estruturas de âmbito regional, legitimadas pelas leis democráticas, e que assumam os poderes e competências que lhes permitam promover o desenvolvimento socieconómico da respectiva.
No entanto, apesar da sua inserção na lei fundamental do país, os sucessivos governos encontraram sempre razões para não seguirem o projecto da regionalização.

A necessidade da regionalização nunca foi motivo de discórdia entre as várias facções políticas. O único problema foi o facto de nunca se ter tornado uma estratégia de poder de nenhuma elite específica.

Tradição Portuguesa: Central - Local


Portugal sempre funcionou numa articulação entre os poderes 'central' e 'local': nunca houve espaço para um órgão político a nível regional.
No entanto, a realidade da economia e da sociedade portuguesa das últimas décadas tem demonstrado a urgência de se criarem órgãos administrativos neste nível de decisão.
Infelizmente as correntes idealistas que se opõem à regionalização têm conseguido difundir muito bem o seu ponto de vista entre a opinião pública, o que resultou na vitória contra a regionalização no referendo realizado em 1998.

Questões económicas da regionalização: a eficiência na afectação de recursos

Passando agora à vertente puramente económica, relaccionada com a regionalização como veículo para garantir uma mais eficiente afectação dos recursos.

Por isso, é preciso ver em primeiro lugar o que se entende por eficiência na afectação de recursos,
que pode ser entendido como a melhor maneira de se proceder à afectação, de recursos, para que não seja possível melhorar o bem-estar de um agente económico sem prejudicar o bem-estar de outrem.
Isto implicará necessariamente que o Estado dê às pessoas uma afectação de recursos de acordo com as suas preferências. Será que isso é conseguido actualmente? E com a regionalização?

Que vantagens poderá trazer a regionalização, para a melhoria da afectação de recursos:
- Com a regionalização, a participação dos cidadãos na resolução de questões e problemas no âmbito da região onde vivem será maior, o que permitirá um maior cumprimento dos princípios da democracia participativa;
- A existência de governos regionais permite uma melhor gestão dos fundos públicos e uma maior eficiência da sua estrutura (eliminação de alguns serviços que se revelem desnecessários, e uma redução dos custos) e da intervenção pública: a regionalização conduzirá a uma reforma profunda do Estado, da sua estrutura, funções e competências;
- A regionalização, enquanto distribuidora de poderes e protagonismos permite um melhor funcionamento da administração pública, e uma melhor afectação dos seus recursos materiais, técnicos e humanos às efectivas necessidades de cada região. Só assim será possível uma mais eficiente organização da Administração Pública e afectação dos seus recursos;

Mesmo as correntes que mais se opõem à regionalização não podem negar que a descentralização tornará a Administração Pública mais eficaz, pois existem certas decisões políticas que seriam melhor tomadas e implementadas, num nível de administração intermédio entre o central e o local, sobretudo porque há questões e problemas específicos de uma dada região e que afectam um número de agentes económicos superior a uma freguesia ou concelho.


Na próxima mensagem sobre este assunto, vou começar por falar sobre a análise normativa e positiva da perspectiva económica da regionalização de Portugal Continental.

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